quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

A Batalha de Lechfeld

“Enquanto em 955 o rei Otton estava em campanha contra os eslavos, um exército húngaro de mais de 100.000 homens abateu-se sobre a Baviera, devastando-a. A vitória que o rei obteve sobre esse inimigo a 10 de agosto em Lechfeld, junto de Augsburgo, é uma das mais formosas, digna de agradecer-se e cheia de conseqüências.
A Alemanha teve desde então tranqüilidade, a derrota trouxe como efeito para os húngaros a conversão ao Cristianismo e, com isso, a entrada no concerto dos reinos católicos.
A derrota de Lechfeld foi a salvação da nação húngara. Se os húngaros tivessem permanecido pagãos, teriam compartilhado a sorte dos hunos e ávaros, os quais finalmente sucumbiram ante os povos civilizados.
Sem declaração de guerra, os húngaros tinham invadido a Alemanha a mando de três generais: Lehel, Bultzu e Botend. Tentaram tomar Augsburgo, protegida por um simples muro.
O Duque Henrique estava doente em Regensburg. A surpresa foi tão rápida e violenta que o exército bávaro não pôde reunir-se do outro lado do Lech.
Se Augsburgo se sustentasse alguns dias, Otton teria tempo para reunir um exército. Isto ter sido possível foi mérito de Santo Ulrico, Bispo de Augsburgo, fiel partidário do rei.
Com a confiança em Deus própria de um Santo, com o valor de um herói e a prudência de um general, Santo Ulrico dirigiu a defesa da cidade.
Refreiou os temerários, e suas palavras e orações inflamaram o menosprezo da vida nos corações dos tímidos. Um assalto se seguia a outro. Entre a chuva dos projéteis, o Prelado de 65 anos, com ornamentos sacerdotais, sem escudo, montado a cavalo, sem ser ferido por nenhuma seta, inflamava os lutadores, consolava os feridos e dava conselhos e ordens.
– “Ainda nas sombras da morte, não temo, porque Vós estais comigo, ó Senhor” era a máxima do heróico bispo.
Cada dia crescia o perigo, mas também aumentava o entusiasmo da resistência, ao passo que os comandantes dos húngaros tinham de empurrar a chibatadas suas coortes contra os católicos, quando o som dos olifantes surpreendeu os assediantes, que nas suas costas viram ondular ao longe as bandeiras das tropas imperiais.
De fato, Otton avançava com uma tropa escolhida de saxões, caminhando por Weissengur a Denauwort. Chamou a si a Boêmia, a Suábia e as tropas da Baviera:
“Também o Duque Conrado, com uma numerosa cavalaria, chegou ao acampamento, e animados por sua chegada, os guerreiros desejavam que não se diferisse a peleja. No combate, ora a pé, ora a cavalo, era irresistível. Para seus amigos era tão caro na guerra como na paz”.
Os húngaros recolheram-se na margem esquerda do Lech. Um profundo sentimento religioso penetrava o exército alemão.
“A 9 de agosto mandou-se fazer no acampamento um jejum e que todos estivessem preparados para a batalha no dia seguinte. Com o primeiro alvor da manhã puseram-se de pé, deram-se mutuamente a paz, e juraram primeiro a seus chefes e logo uns para com outros o mútuo auxílio. Logo saíram do acampamento com as bandeiras ao vento, em número de oito legiões. O exército foi conduzido por um terreno acidentado e difícil, para que os inimigos não tivessem ocasião de inquietar a expedição com suas setas”.
As três primeiras legiões constituíam-se de bávaros, a quarta de francos a mando de Conrado, a quinta de escolhidos entre milhares de guerreiros, a mando do próprio Otton, em cuja bandeira estava pintado o arcanjo São Miguel, vencedor dos poderes das trevas.
A sexta e sétima divisões as formavam os suavos a mando de Burkhard II, pois não possuíam ainda o direito de lugar à frente no Império.
Os boêmios, como oitava legião, protegiam as bagagens. Uma divisão de húngaros tinha rodeado o exército formando um largo arco. Com um ataque súbito dispersou a legião de boêmios e pôs os suavos em confusão.
Somente Conrado com seus francos voltou a estabelecer a ordem. Otton já tinha formado sua ordem de batalha, e depois de uma alocução entusiasta, lançou-se com os seus contra o inimigo.
A luta foi longa e árdua. A vitória completa pela tarde. Os inimigos que não juncavam o campo de batalha fugiram sem ordem. Poucos chegaram a seu país. Segundo a lenda magiar, só sete, que foram declarados eternamente sem honra e incapazes de a possuir. Em toda parte levantou-se o povo dos campos como para uma caçada.
Matou e queimou os húngaros fugitivos, julgou-os em fossos, e em um dia vingou-se das injúrias de cinqüenta anos!
Os capitães prisioneiros, Botond, Lehel e Bultzu, não foram tratados conforme o direito da guerra, mas enforcados afrontosamente em Regensburg, porque sem declaração de guerra tinham invadido o país.
Mas com o júbilo misturou-se a tristeza pelo favorito do exército, o heróico Conrado, “o qual, sentindo excessivo calor pelo fogo interior e a violência do sol, que estava muito forte naquele dia, abriu a base do elmo para tomar ar, e caiu ferido na garganta por uma seta”.
Debaixo de sua couraça achou-se um cilício, sinal de quão arrependido estava de sua rebelião, a qual expiou com suas heróicas façanhas e seu sangue.
A derrota de Lechfeld teve para os húngaros o efeito de quebrar a força bárbara da nação e fazer com que os elementos mais nobres ali vencessem.
Outra conseqüência da vitória do dia de São Lourenço foi a fundação das Markas, de onde foi-se formando pouco a pouco a Áustria atual (a Ostmark, que depois seria o Österreich).”
(João Batista Weiss, História Universal)

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