quarta-feira, 3 de maio de 2017

Santo Agostinho: Na oração exercita-se a nossa vontade

“Por que havemos de nos perder em tantas considerações, procurando saber como devemos orar e temendo que as nossas orações não sejam como devem ser? Digamos antes com o salmo: Uma só coisa peço ao Senhor, por ela anseio: habitar na casa do Senhor todos os dias da minha vida, para gozar da suavidade do Senhor e contemplar o seu santuário. Nesta morada não se sucedem os dias um após outro, nem o início de um dia assinala o fim do outro dia; ali todos os dias estão simultaneamente presentes e não têm fim, porque também a vida ali não tem fim.
Para conseguir esta vida bem-aventurada, a própria Vida verdadeira nos ensinou a orar; mas não nos ensinou que devíamos pronunciar muitas palavras, como se fôssemos tanto mais facilmente atendidos quanto mais loquazes nos mostrássemos, porque na oração, como diz o próprio Senhor, dirigimo-nos Àquele que sabe perfeitamente o que nos é necessário, mesmo antes de Lho pedirmos.
Pode parecer estranho que nos exorte a orar Aquele que sabe perfeitamente o que nos é necessário ainda antes de Lho pedirmos. Devemos compreender, porém, que Deus Nosso Senhor não pretende que Lhe demos a conhecer os nossos desejos, que aliás não Lhe podem ser ocultos, mas que exercitemos a nossa vontade, para nos tornarmos capazes de receber o que Ele está disposto a dar-nos. Os seus dons são muito grandes e a nossa capacidade de receber é pequena e muito limitada. Por isso nos é dito: Dilatai o vosso coração; não vos sujeiteis ao mesmo jugo dos infiéis.
Quanto mais fielmente acreditarmos, mais firmemente esperarmos e mais ardentemente desejarmos este dom, mais capazes seremos de o receber... Assim, portanto, havemos de orar, na fé, esperança e caridade, exercitando continuamente a nossa vontade... Quanto mais ardente for o afeto, tanto maior será o efeito. Por isso, quando diz o Apóstolo: Orai sem cessar, que outra coisa quer ele dizer senão que devemos desejar incessantemente a vida bem-aventurada, que só pode ser a vida eterna, pedindo-a Àquele que é o único que a pode dar?”
(Santo Agostinho, Epístola 130)