“Considera como esta vida há de acabar. A sentença proferida: tens que morrer. A morte é certa, mas não se sabe em que momento virá. O que se requer para morrer? Uma parada do coração, o rompimento de uma veia no peito, uma sufocação por catarro, um bocado de algo da garganta, a mordedura de um animal venenoso, uma febre, uma picada, uma chaga, uma inundação, um terremoto, um relâmpago, bastam para tirar-te a vida. A morte te assaltará quando menos pensares. Quantos, à noite, puseram-se a dormir e de manhã foram encontrados mortos. E então, isso pode ocorrer contigo também. Tantos dos que morreram de repente não pensavam em morrer assim; mas assim morreram e, se morreram em pecado, onde estão agora? E onde estarão por toda a eternidade? Mas de qualquer maneira haverá de chegar o dia em que verás o anoitecer, mas não o amanhecer, ou far-se-á dia, mas a noite não verás. “Virei às escondidas, como um ladrão à noite”, diz Nosso Senhor (Mt 24,46-44). Isso foi avisado pelo teu bom Senhor, pois que ama tua saúde espiritual.
Corresponde a Deus, aproveita de seu aviso, prepara-te a bem morrer, antes que a morte chegue: “Estote parati” (Lc 12,40). É certo que tens de morrer. Acabará tua cena no palco da vida e não sabes quando. Quem sabe se em um ano, um mês, ou até mesmo amanhã. “Meu Jesus, dá-me luz e perdoa-me”.
Considera que na hora da morte estarás estendido em teu leito, assistido por um sacerdote que te lembrará de tua alma, com teus parentes, ao lado de ti, chorando... Com um crucifixo na cabeceira e uma vela aos pés, já próximo de passares para a eternidade... Tu sentirás a cabeça doendo, a visão turva, a língua seca, as mandíbulas fechadas, o peito pesado, o sangue gelado, a carne consumida, o coração trespassado: Deixarás tudo para trás e pobre, e nu, serás jogado numa vala; aqui os vermes e os ratos roerão toda a tua carne e não restará de ti senão um bocado de pó fedorento e alguns ossos carcomidos. Abre uma fossa e vê o que restou daquele ricaço, daquele avarento, daquela mulher vã! Assim acaba a vida. Na hora da morte ver-te-ás rodeado de demônios que te porão face a face com todos os teus pecados, desde quando eras criança. Pois bem, sabe que o demônio, para induzir-te a pecar, cobre e perdoa a culpa; te diz que aquela vaidade, aquele prazer, aquele rancor, nada têm de mal; que aquela conversa nada teve de malévolo... Mas na hora da morte te fará conhecer a gravidade de teu pecado e, à luz daquela eternidade para a qual hás de passar, conhecerás o mal que fizeste para ofender um Deus infinito... Vamos, pois, remedia em tempo, agora que o podes, porquanto, então, não haverá mais tempo.
Considera como a morte é um momento do qual a eternidade depende. Jaz o homem perto de morrer e, por conseguinte, vizinho a uma de duas eternidades; do último suspiro depende a sorte de estar a alma a salvo ou danada para sempre, momento do qual depende uma eternidade; uma eternidade de glórias ou de penas. Uma eternidade sempre feliz ou infeliz: ou de contentamentos, ou de angústias e ansiedade. Uma eternidade gozando de todo o bem ou padecendo de todo o mal. Um paraíso ou um inferno, pela eternidade. Se naquele momento te salvares, não terás mais problemas, viverás contente e beato; mas se perdes a oportunidade, serás infeliz e desesperado enquanto que Deus será sempre Deus. Na morte conhecerás o que significa paraíso, inferno, pecado, ofender a Deus, lei de Deus desprezada, pecados sem confissão, coisas a restituir. “Mísero de mim!” dirá o moribundo. “Daqui a poucos momentos comparecerei perante o Senhor e sabe-se lá qual será minha sentença. Para onde irei, para o Paraíso ou para o inferno? Gozar entre os anjos ou arder entre os danados? Serei, eu, um filho de Deus ou um escravo do demônio? Em poucos minutos sabê-lo-ei e, ai de mim, onde alojarei da primeira vez, ali ficarei em eterno. Ah... Daqui a algumas horas, alguns minutos, que será de mim? Que acontecerá comigo se não ressarcir aquele dano, se não restituir aquilo que não é meu, se não restituir a fama a quem a fiz perder, se, de coração, não perdoar meu inimigo, se não me confessar bem?”. Então detestarás mil vezes aquele dia em que pecaste, aquele gosto, aquela vingança... O arrependimento será tardio e sem frutos, porquanto vindo do temor do castigo e não do amor a Deus. Ah Senhor, deste momento converto-me a Vós, não quero esperar a morte; eis que, agora, eu Vos amo, vos abraço e quero morrer abraçado a Vós. Maria minha mãe, fazei-me morrer sob Vosso manto, ajudai-me!”