quarta-feira, 6 de junho de 2012

A visão economicista da história

“A teoria materialista da história, segundo a qual todas as políticas e éticas são a expressão da economia, é na verdade uma falácia muito simples. Ela consiste apenas em confundir as condições necessárias da vida com as necessárias preocupações da vida, que são bem diferentes. É como dizer que, pelo fato de o homem poder andar sobre apenas duas pernas, ele nunca anda por aí a não ser para comprar sapatos ou meias. O homem pode viver sem os dois sustentos da comida e da bebida, que o apóiam como duas pernas; mas sugerir que eles têm sido os motivos de todos os movimentos na história é dizer que o objetivo de todas as marchas militares ou peregrinações religiosas deve ter sido a perna de ouro de miss Kilmansegg ou a perna ideal ou perfeita de sir Willoughby Patterne. Mas são esses movimentos que compõem a história da humanidade e sem eles não haveria praticamente nenhuma história. As vacas podem ser puramente econômicas, no sentido de que não conseguimos perceber que elas façam grandes coisas além de pastar e procurar pastagens melhores; e é por isso que uma história das vacas em doze volumes não seria uma leitura muito interessante. Ovelhas e cabras podem ser economistas puros pelo menos em suas ações externas; mas é por isso que a ovelha nunca foi uma heroína de guerras e impérios épicos considerados dignos de uma narração detalhada; e até mesmo o quadrúpede mais ativo não inspirou um livro para crianças intitulado Áureos Feitos de Bodes Valentes ou algum título semelhante. Mas até aqui, no que concerne aos elementos que compõem a argumentação de que o ser humano é um ser econômico, podemos dizer que a história só começa onde o motivo das vacas e ovelhas sai de cena. Será difícil sustentar que os cruzados partiram de suas casas para a vastidão infinita porque as vacas partem de uma vastidão para as pastagens mais agradáveis. Será difícil sustentar que os exploradores do Ártico foram para o norte levados pelo mesmo motivo material que fez as andorinhas irem para o sul. E se da história humana excluirmos fatos como todas as guerras religiosas e todas as explorações simplesmente aventureiras, ela não deixará simplesmente de ser humana, mas simplesmente deixará de ser história. O esquema da história é feito dessas curvas e ângulos decisivos determinados pela vontade do homem. A história econômica nem sequer seria história.”
(Gilbert Keith Chesterton, The Everlasting Man)

Tradução de Almiro Pisetta