terça-feira, 14 de setembro de 2010

O ser é aquilo que a mente conhece em primeiro lugar


“Quem, pois, deseja contemplar as perfeições invisíveis de Deus, quanto à unicidade da natureza, fixe primeiramente o inspecto da mente na existência mesma, e veja que esta é em si de tal maneira certíssima que não se pode pensar que não exista. Com efeito, a existência mesma, na sua máxima pureza, não se concebe senão por afastamento total da não-existência, do mesmo modo que não se concebe o nada senão por afastamento total da existência. Assim, pois, como o nada absoluto nada tem da existência nem das prerrogativas desta, assim também, e em contraposição, a mesma existência nada tem da não-existência, - nem em ato, nem em potência; nem segundo a verdade objetiva, nem segundo a nossa maneira de pensar. Sendo porém a não-existência privação da existência, não é conhecida pela inteligência senão por meio da existência; em contraposição, a existência não é conhecida por intermédio de nenhuma outra coisa. Efetivamente, tudo o que se intelecciona, ou se intelecciona como não-ser, ou como ser-em-potência, ou como ser-em-ato. Ora, se o não-ser não se pode inteleccionar senão pelo ser, e o ser-em-potência senão pelo ser-em-ato, e dado que a existência designa o próprio ato puro de ser, segue-se que a existência é aquilo que a inteligência primeiramente conhece, e essa existência é a que é ato puro. Tal existência, por sua vez, não é uma existência particular, pois esta é uma existência reduzida, por estar misturada com limite; nem é uma existência análoga, porque esta tem o mínimo de realidade, por isso mesmo que tem o mínimo de existência. Resta pois que tal existência é a existência divina.”
(São Boaventura, Itinerarium Mentis ad Deum)

Tradução de A. S. Pinheiro

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