segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

A questão dos universais

“Ei-la nos termos mais simples: além das imagens sensitivas, variáveis e particulares, possuímos os conceitos universais, representações intelectivas, necessárias, imutáveis e aplicáveis a um número indefinido de indivíduos.
Ora, sendo as realidades sujeitas à nossa experiência, mutáveis e contingentes, qual o valor objetivo destes conceitos? Com que fidelidade exprimem eles a realidade extrema? Como explicar a contradição aparente entre o caráter de universalidade das nossas idéias e o caráter de individualidade e de contingência das coisas em si? Destas perguntas nasceu a famosa questão dos universais, uma das mais escabrosas e importantes de toda a filosofia. A questão do valor objetivo das ciências está toda aí. Das quatro soluções possíveis originaram-se outros tantos sistemas diversos, conhecidos com os nomes de realismo exagerado, nominalismo, conceptualismo e realismo moderado.
O realismo exagerado, para salvar a perfeita correspondência entre o conhecimento e o objeto, afirma, contra toda a evidência experimental, a existência de realidades objetivas formalmente universais. Platão, entre os gregos, Guilherme de Champeaux, na Idade Média, Ubaghs e La Forêt em nossos dias, são realistas exagerados.
O nominalismo, partindo do mesmo princípio que o sistema precedente, nega a existência dos conceitos universais, concedendo a universalidade somente aos vocábulos ou termos comuns, reduzidos ao simples mister de designar uma coleção de indivíduos ou uma série de acontecimentos. Pode-se duvidar se tal sistema teve adeptos na Idade Média. Entre os modernos, St. Mill, Taine, Ribot e, em geral, os positivistas professam o nominalismo, que então se confunde com o empirismo.
O conceptualismo admite só o valor ideal dos conceitos universais, negando uma realidade extramental que lhes corresponda. O fenomenismo de Kant é uma nova forma de conceptualismo.
O realismo moderado, aristotélico ou tomista, única solução que põe a salvo a objetividade do conhecimento científico e se harmoniza com os dados da consciência, defende o valor real e objetivo das idéias, estabelecendo uma distinção entre o modo por que a coisa existe em si e o modo por que existe na inteligência. Em si, os objetos de uma mesma espécie são singulares e individuais mas participam duma natureza comum, pela qual se assemelham.
Na inteligência, esta natureza comum, despida pela abstração dos caracteres individuais a que se acha unida na realidade, reveste os atributos de universalidade próprios do conceito. O universal, portanto, só existe, formalmente, na inteligência, mas a semelhança real dos seres duma mesma espécie presta-lhe um fundamento objetivo e justifica a aplicabilidade do tipo abstrato a todos os representantes individuais e concretos.”
(Pe. Leonel Franca, S.J, Noções de História da Filosofia)