quinta-feira, 16 de junho de 2011

Comunhão na mão (I)

“A noz é uma nogueira em potencial; já a nogueira é uma noz que se desenvolveu e atingiu a plenitude de uma planta. Querer fazer que uma árvore retorne ao seu estado de semente seria uma estúpida regressão ou atraso. Por esse mesmo motivo, Pio XII lançou uma clara condenação ao “arqueologismo litúrgico” na Mediator Dei com as seguintes palavras: (n. 51) “...Como, em verdade, nenhum católico fiel pode rejeitar as fórmulas da doutrina cristã compostas e decretadas com grande vantagem em época mais recente da Igreja, inspirada e dirigida pelo Espírito Santo, para voltar às fórmulas dos primeiros concílios, ou repudiar as leis vigentes para voltar às prescrições das antigas fontes do direito canônico; assim, quando se trata da Sagrada Liturgia, não estaria animado de zelo reto e inteligente aquele que quisesse voltar aos antigos ritos e usos, recusando as recentes normas introduzidas por disposição da Divina Providência e por mudança das circunstâncias. Este modo de pensar e de proceder, com efeito, faz reviver o excessivo e insano arqueologismo suscitado pelo ilegítimo concílio de Pistóia, e se esforça em revigorar os múltiplos erros que foram a base daquele conciliábulo e os que se lhe seguiram com grande dano das almas, e que a Igreja – guarda vigilante do depósito da fé confiado pelo seu divino fundador – condenou com todo o direito. De fato, deploráveis propósitos e iniciativas tendem a paralisar a ação santificadora com a qual a sagrada liturgia orienta salutarmente ao Pai celeste os filhos de adoção”.
De tal obsessão mórbida, ou seja, da “arqueologite”, tornaram-se presas fáceis os pseudo-liturgistas que assolam a Igreja em defesa do Concílio Vaticano II. Pseudo-liturgistas que chegam ao ponto de incitar seus subordinados com exortações e exemplos a violar aquelas poucas leis que ainda sobrevivem e que foram justamente por eles mesmos promulgadas e confirmadas.
O caso mais sintomático a esse respeito é o do rito da Sagrada Comunhão. Alguns bispos, depois de terem reconhecido e proclamado que o rito tradicional de colocar as Sagradas Espécies sobre a língua do comungante ainda está em vigor e é o ordinário, permitem ou abrem concessão para que a Comunhão seja dada na mão ou até em serviços “self-service”. Ora, se o objetivo é convencer os fiéis de que a Santa Eucaristia não é nada mais do que pão comum, talvez abençoado, mas simples pão para uma refeição simbólica, o mais certo é instruir para que os fiéis o recebam pela via direta: a via do sacrilégio.
Os advogados da Comunhão na mão apelam para aquele arqueologismo pseudo-litúrgico condenado apertis verbis por Pio XII. Dizem e repetem aos quatro ventos que é desse modo que os fiéis devem receber a comunhão porque é desse modo que a comunhão foi distribuída em toda a Igreja, seja no Oriente, seja no Ocidente desde as origens e por mais de mil anos. Mais grave ainda é que essa mentira é ensinada tanto às crianças que estão iniciando sua vida litúrgica com a Primeira Comunhão, como aos seminaristas que se tornarão os futuros sacerdotes.
É fato incontestável que desde as origens do Cristianismo e depois, por quase dois mil anos, o comungante era obrigado a abster-se de qualquer alimento ou bebida, desde as vésperas até o momento da Missa, como preparação para a Comunhão. Ora, se querem mesmo fazer recurso ao “arqueologismo” para promover a comunhão na mão, por que então não restauram juntamente o mesmo jejum eucarístico daqueles tempos? Certamente tal costume contribuiria muito para manter viva na mente dos fiéis a consciência sobre a seriedade do sacramento que estariam por receber, bem como para prepará-los espiritualmente.
Ao contrário, a alegação de que o uso da Comunhão na mão era costume ordinário tanto da Igreja Ocidental como Oriental por mais de mil anos é totalmente falsa.
O cavalo de batalha desses pseudo-liturgistas é a seguinte passagem da Catequese Mistagógica atribuída a São Cirilo de Jerusalém:
“Adiens igitur, ne expansis manuum volis, neque disiunctis digitis accede; sed sinistram velut thronum subiiciens, utpote Regen suscepturae: et concava manu suscipe corpus Christi, respondens Amen”. (Dirigindo-se pois [à comunhão] aproximai-vos com as palmas das mãos abertas, nem com os dedos disjuntos, mas tendo a esquerda em forma de um trono sob aquela mão que está para acolher o Rei e com a direita côncava, recebei o corpo de Cristo, respondendo Amém).
Ao chegar nesse Amém, simplesmente param. Mas a Catequese Mistagógica prossegue o texto acrescentando a seguinte passagem: “Postquam autem caute oculos tuos sancti corporis contactu santificaveris, illud percipe... Tum vero post communionem corporis Christi, accede et ad sanguinis poculum: non extendens manus; sed pronus (em grego: ‘allà kùpton, que São Belarmino traduz: genuflexo), et adorationis ac venerationis in modum, dicens Amen, sanctericeris, ex sanguine Christi quoque sumens. Et cum adhuc labiis tuis adbaeret ex eo mador, manibus attingens, et oculos et frontem et reliquos sensus sanctifica... A communione ne vos abscindite; neque propter peccatorum inquinamentum sacirs istis et spiritualibus defraude mysteriis”. (Depois que tu, com cautela, tiveres santificado os teus olhos, pondo-te em contato com o Corpo de Cristo, aproxima-te também do cálice do sangue: não tendo as mãos estendidas, mas genuflexo, de modo a expressar senso de adoração e veneração. Dizendo amém, te santificarás, tomando também o sangue de Cristo. E tendo ainda os lábios úmidos, toca-os com as mãos e depois com esse santificarás os teus olhos, a fronte e os outros sentidos. Da comunhão jamais vos afastai, nem vos privai destes sagrados e espirituais mistérios, ainda que estejais manchados pelos pecados) (P. G. XXXIII, coll. 1123-1126).
Quem poderia admitir que um tal rito fosse o costume ordinário na Igreja Universal por mais de mil anos? E como conciliar tal rito, segundo o qual a Comunhão deve ser dada até a quem está manchado de pecado, com a ordem, certamente apostólica, que desde os primórdios da Igreja proibia que fossem admitidos à Santa Comunhão aqueles que estavam em estado de pecado? “Itaque quicumque manducaverit panem hunc, vel biberit calicem Domini indigne, reus erit corporis et sanguinis Domini. Prober autem seipsum homo: et sic de pane illo edat, et de calice bibat. Qui enim manducat et bibit indigne, indicum, sibi manducat et bibit non diiudicans Corpus Domini”. (Portanto, todo aquele que comer o pão ou beber o cálice do Senhor indignamente será culpável do Corpo e do Sangue do Senhor. Que cada um examine a si mesmo, e assim coma e beba desse cálice. Aquele que o come e bebe sem distinguir o Corpo do Senhor, come e bebe a sua própria condenação (I Coríntios 11, 27-29).
Um tal rito de comunhão tão extravagante, cuja descrição se conclui com a exortação a receber ou distribuir a Santa Comunhão até para aqueles que se encontram manchados de pecado, certamente não foi pregado por São Cirilo na Igreja de Jerusalém e nem poderia ter sido lícito em qualquer época na Igreja. Trata-se de um rito derivado da fantasia, oscilando entre o fanatismo e o sacrilégio, do autor das apócrifas Constituições Apostólicas, um anônimo Siriano, devorador de livros, escritor incansável, que despeja nos seus escritos, indigestos e contaminados em grande parte com suas elucubrações mentais, grandes porções de leituras, o qual, no seu livro VIII das ditas Constituições Apostólicas, acrescenta, atribuindo ao Papa São Clemente, 85 Cânones dos Apóstolos, os quais o Papa Gelásio I declarou como apócrifos no Concílio De Roma do ano 494: “Liber qui appelatur Canones Apostolorum, apocryfus” (P. L., LIX, col. 163).”
(Rev. Giuseppe Pace, S.B.D, San Cirilo di Gerusalemme e la Comunione sulla Mano)