sexta-feira, 25 de novembro de 2011
Vladimir Bukowsky: O socialismo é uma utopia das elites destinada ao fracasso
“-Vladimir, estamos no ano de 2010, e em 2010 os europeus estão presentemente vivendo sob o jugo do que você descreveu como a nova URSS, ou seja, a URSE. A União Européia, com sua forma aparentemente democrática, inclusive com pão e circo fornecidos pelos meios de comunicação de massa, mas de qualquer maneira gerida por um tipo soviético de administração centralizada.
Você que viveu em nosso futuro, na sua opinião como é possível que as elites não entendam que seu modelo político é inevitavelmente destinado ao fracasso como aconteceu na URSS?
-Veja, basicamente eles todos acreditam no socialismo de uma maneira ou de outra, em uma forma de socialismo ou outra. E eles jamais perderam essa crença. Ele é mais ameno do que a ideologia comunista em termos de violência. O comunismo acredita em mudanças rápidas, radicais e revolucionárias, ao passo que a maior parte do socialismo europeu acredita em mudanças evolutivas, reformas e coisas do tipo. Mas seu objetivo final é o mesmo: eles querem criar igualdade, igualdade social, eles querem criar coisas que não existem na natureza e que jamais existirão. E eles jamais entenderam que essa é uma idéia falsa. Eles sempre criticam os soviéticos por seus métodos, mas não por seu objetivo final. E eles jamais são duros com os soviéticos porque, “veja bem, eles estão mais ou menos fazendo o que nós queremos fazer, mas estão fazendo do modo errado”; portanto, para eles era uma espécie de proporção, de proporção ideológica. Dessa forma, não surpreende que eles estejam tentando fazer agora o mesmo que a União Soviética tentou do seu próprio jeito, apenas numa versão um pouco mais suave, com métodos mais civilizados, eu diria. No entanto, é a mesma idéia, e o resultado será também o mesmo. Porque o que os visionários do tipo socialista jamais chegaram a entender é que a idéia do socialismo é contrária à natureza humana. Nós não queremos igualdade. Nós queremos igualdade quando somos muito pobres. A partir do momento que nos tornamos ricos, deixamos de querer igualdade. Essa foi a maior desilusão na Rússia para os comunistas que realmente acreditavam no comunismo, pois tão logo qualquer trabalhador ou proletário tornava-se mais próspero, ele não queria mais saber de igualdade, ele queria sua propriedade. O experimento soviético é bastante revelador. Infelizmente, o Ocidente, cego em sua ignorância e desejo de ver implementada a utopia, jamais estudou o experimento soviético. Eles deveriam estudá-lo ponto a ponto, porque foi tentado de tudo. Eles tentaram. Particularmente no começo, nas décadas de 20 e 30, eles ainda acreditavam nisso, depois eles mesmos passaram a não acreditar mais e trataram apenas de sobreviver. Manter-se no poder, só isso. Eles perderam suas crenças. Mas nas décadas de 20 e 30 eles acreditavam. E eles tentaram tudo de todas as maneiras e eu posso reconhecer hoje muitas coisas que estão acontecendo na Europa que já foram testadas e abandonadas na União Soviética. Porque não funcionam. Veja, por exemplo, o sistema educacional. Eles inventaram o chamado sistema de “educação progressiva”; não há provas, não há “stress”, não há trauma para as crianças, esse tipo de coisas. O resultado é que, pela primeira vez em cem anos, as crianças inglesas estão terminando a escola tecnicamente analfabetas. Porque elas não aprendem coisa alguma. Os soviéticos estavam testando isso nos anos 20. Eles experimentaram toda possibilidade do mesmo tipo de educação: educação coletiva, o método das brigadas, tudo. Mas depois eles tiveram que abandonar isso porque eles precisavam de cientistas, eles precisavam de especialistas e de bons técnicos, então eles tiveram de desistir desses experimentos e retornar a um sistema de educação mais tradicional. Hoje eu observo com horror como o Ocidente está repetindo esse experimento fracassado que nós sabemos irá fracassar, nós sabemos que nada na terra o fará funcionar e apesar disso eles continuam tentando, e eles têm gerações após gerações de estudantes que terminam a escola analfabetos. Que não aprenderam nada. E esse é só um exemplo. Se você atentar para o panorama geral, o que está acontecendo, eles todos estão fazendo isso. No fundo, essas pessoas jamais acreditaram na democracia. Elas acreditam que a democracia é um bom veículo para alcançar o que elas querem alcançar: a igualdade. A igualdade que as permitiria ser juízes dessa igualdade. Sim, porque isso é o que as pessoas ficam esquecendo. Não é totalmente altruísta, toda essa idéia de igualdade. Porque alguém deverá ser o juiz, alguém deverá estar em desigualdade, e essas pessoas deverão ser mais iguais do que as outras. Isso foi o que Orwell percebeu. Mas a maioria desses socialistas e visionários ocidentais jamais entendeu isso. Seus egos e interesses egoístas estão muito bem disfarçados por trás da ideologia, eles estão “fazendo o bem para a humanidade”, quando estão fazendo o bem para si mesmos. Só que isso está muito bem escondido. Alguns deles não entendem. Seja como for, a concepção inteira não funciona. Toda essa concepção, criada na Revolução Francesa há 200 anos, é simplesmente lixo. Ela não pode funcionar. “Egalité, fraternité, liberté”. Ok, você pode ter liberdade mas não pode ter igualdade, ou é uma ou a outra. Isso não funciona. Como Joseph Brodski disse certa vez com notável precisão, a igualdade exclui a irmandade. Ou vocês são iguais ou são irmãos, não se pode ser ambos. Essa é uma idéia falsa que por várias gerações e durante séculos foi entretida pelas pessoas educadas da Europa e do mundo inteiro, começando em Atenas, na Grécia e assim por diante, que se cristalizou na França há 200 anos, onde foi pela primeira vez posta em prática. Antes eles apenas a discutiam, entre eles mesmos, alguns filósofos e pensadores. Mas na França, há 200 anos, eles tentaram implementá-la na vida real. E isso terminou na guilhotina. Naturalmente. Porque se você tenta fazer todas as pessoas iguais, algumas terão que ter as cabeças cortadas, enquanto outras serão esticadas, porque elas não são iguais, elas são todas diferentes. Você tem que encontrar um padrão, um paradigma, pelo qual você os medirá a todos. Isso é o que vai acontecer sempre e em qualquer lugar que você tentar. Mesmo com as melhores intenções, o final será sempre a violência, o Gulag, as cabeças cortadas, sem que se alcance qualquer igualdade. O mais interessante é que, mesmo com toda essa violência e zelo revolucionário e mudanças radicais na Rússia feitas pelos comunistas, no final eles terminaram na mais desigual das sociedades, onde a nomenklatura tem enormes privilégios, seus próprios aviões, seus próprios iates, seus próprios palácios e a maioria não tem nada, nem sequer pão. E isso depois de 73 anos tentando fazer todo mundo igual. Há milionários subterrâneos, por outro lado, não pertencentes à nomenklatura, que seriam executados se fossem apanhados. E apesar disso, segundo estimativas dos economistas em 1999, nós tínhamos vários milhões de milionários subterrâneos. Milionários secretos. Logo, não adianta. Você não pode forçar as pessoas a serem iguais, porque elas não são iguais. Certo? Assim, respondendo à sua pergunta, qual é o conceito básico ou filosofia dos que criaram a União Européia. Eles são visionários, uma espécie branda de visionários, não tão radicais como os comunistas, mas mesmo assim visionários. Eles acreditam que os sentimentos nacionalistas podem ser completamente destruídos, que o estado nacional pode ser eliminado como os comunistas acreditavam, eles acreditavam que o estado nacional deveria desaparecer. O resultado ao final do experimento foi um incêndio de nacionalismos em todas as partes da Rússia. Aconteceu exatamente o contrário. E os armênios e os azeris ficavam se matando uns aos outros e nos estados bálticos os russos e os lituanos estavam se matando e assim por diante. É um experimento fracassado. Você sabe que está fadado ao fracasso. Por quê? Porque é contra a natureza humana.”
(Vladimir Bukowsky, em trecho de vídeo-entrevista de 18.2.2010)
http://www.livingscoop.com/watch.php?v=Mjcw