sábado, 2 de janeiro de 2010

Alexis de Tocqueville e como a revolução francesa se processou à maneira das revoluções religiosas


“A Revolução Francesa agiu em relação a este mundo exatamente como as revoluções religiosas operam em relação ao outro. Tem considerado o cidadão de uma maneira abstrata, fora de qualquer sociedade particular, da mesma maneira como as religiões consideram o homem em geral, independentemente do país e da época. Não pesquisou tão-somente qual era o direito particular do cidadão francês mas também quais os deveres e direitos gerais dos homens em matéria política.
Foi remontando sempre dessa maneira ao que havia de menos particular e por assim dizer de mais natural em matéria de estado social e governo que a Revolução Francesa conseguiu tornar-se compreensível a todos e copiável em cem lugares ao mesmo tempo.
Como parecia aspirar mais ainda à regeneração do gênero humano que à reforma da França, acendeu uma paixão que as revoluções políticas as mais violentas jamais conseguiram produzir até então. Inspirou o proselitismo e gerou a propaganda. Foi assim que pegou este ar de revolução religiosa que tanto apavorou os contemporâneos, ou melhor, tornou-se ela própria uma espécie de nova religião, uma religião imperfeita, é verdade, sem Deus, sem culto, sem Além, mas que, todavia, como o islamismo, inundou toda a terra com seus soldados, apóstolos e mártires.
Não se deve pensar, entretanto, que seus procedimentos não tivessem precedente algum e que todas as idéias que difundiu fossem inteiramente novas. Houve em todos os séculos e até em plena Idade Média agitadores que, para mudar os costumes, invocaram as leis gerais das sociedades humanas e que empreenderam opor à constituição de seu país os direitos naturais da humanidade. Mas todas essas tentativas falharam: a mesma tocha que tocou fogo na Europa no século dezoito foi apagada com facilidade no século quinze. Para que argumentos dessa espécie produzam revoluções é preciso que algumas mudanças nas condições, costumes e usos já tenham ocorrido e preparado o espírito humano a se deixar penetrar por eles.”
(Alexis de Tocqueville, L’Ancien Régime et La Révolution)

Tradução de Yvonne Jean

2 comentários:

  1. Prezado Theophilus, Laudetur Dominus!

    Muito interessante esta última frase, principalmente levando em conta que foi escrita em 1856, por que descreve exatamente o que está em curso nos nossos dias: a corrupção dos usos e costumes como prática revolucionária generalizada e sendo até mesmo tratada como um meio legítimo de conseguir apoio por pretensos "cientistas".

    É interessante notar o caráter "quase religioso" da Revolução Francesa, principalmente se levarmos em consideração que a maçonaria teve grande influência nos movimentos que a promoveram. É curioso também notar que o resultado de constantes revoluções através da hitória têm cada vez mais empurrado o homem em direção a uma "religião laica", tendo o Estado como "deus", que decide quem vive ou morre e se intromete até em questões de âmbito mais privado, como a educação dos filhos ou a linguagem usada nas conversas.

    Pax et Salutis

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  2. “De um lado o espírito da sociedade política, do outro o culto das forças materiais do cosmos. A aliança de religião estatal e religião do cosmos opõe-se à aliança de Deus com o homem.” Olavo de Carvalho.

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