quinta-feira, 8 de junho de 2023

A filosofia não é para as massas


” A superioridade do verbo mental, do conceito sobre a palavra escrita reside na circunstância de que esta última apresenta um problema grave, segundo Platão: o escrito não pode "calar-se", ocultar-se para aqueles perante os quais conviria o silêncio. Mas, a propósito, quem seriam estes? A maioria, de acordo com Platão, ou a massa imbecilizada ("multitudo stultorum"), para Santo Tomás, formada por pessoas que não se desvencilham das questões comezinhas do dia-a-dia.
O peso do agora esmaga-lhes e, por esta razão, a sua tendência é contentar-se com placebos ideológicos, distrações fúteis ou afazeres "terapêuticos" para amenizar o momento presente; não querem a verdade porque simplesmente não a suportariam. Para o horizonte mental dessas pessoas bastam frases de efeito, slogans, qualquer coisa que lhes dê uma telúrica sensação de segurança, hipertrofie neuroticamente a sua auto-estima.
São demasiado terra-a-terra e contemplar o céu os ofende; portanto, ai de quem ousa dizer-lhes que, fora da sua amada caverna – onde matam o tempo distraindo-se com as sombras –, há belezas mais excelsas para conhecer e amar...
Em síntese, escrever de maneira satisfatória ou proficiente para a multidão é impossível; esta nutre uma secreta afeição pela pequenez, pela mediocridade travestida de excelência, pelo ouropel. Neste sentido fala Aristóteles do encanto que certas melodias têm sobre a "massa de escravos", entendidos não no sentido político ou social do termo, mas como criaturas psiquicamente desprovidas de capacidade deliberativa – para as quais seguir a boiada é uma espécie de atitude instintiva, uma tendência, uma triste vocação.
A filosofia, dado o seu caráter abstrato, é para a minoria e não para as massas. Sempre foi assim e assim sempre será; isto nada tem de elitismo...
Uma época que, tresloucadamente, pense ser a filosofia feita de encomenda para o povão há de idolatrar os Leandros Carnais em detrimento dos Sócrates; preferirá os freis Bettos a qualquer Santo Agostinho que apareça.
A malta sempre escolherá o Barrabás da vez, justificando-se com a régua que mede a sua própria perversidade.”
(Sidney Silveira, em postagem no Facebook de 21.08.2020)