domingo, 2 de maio de 2021
Ou o Estado paternal, ou o Estado das feras tirânicas
“As nações ocidentais, perdida a religiosidade, vão-se tornando aos poucos as “Feras” da Escritura. O Estado moderno se torna aos poucos tirano. O “Estado” é uma consequência do pecado original, não é uma criação direta de Deus, é a “criação maior da razão prática” do homem, ensina Santo Tomás. No Paraíso Terrestre, se Adão não tivesse caído, teria havido governo, por certo; mas não governo estatal, e sim familiar e paterno. Isso já não se pode mais obter com perfeição. Entre os extremos do governo tirânico e do governo paterno, oscilam todos os regimes políticos humanos, depois do Pecado.
Nos grandes séculos cristãos tendeu-se a realizar o ideal do governo paterno: São Luís rei da França, São Fernando da Espanha, São Eduardo o Confessor. Havia um monarca que vinha ao trono com a naturalidade da fruta nas árvores, que tentava fazer-se respeitar e amar por todos, e que dava conta de suas ações só a Deus; e havia uma quantidade de forças políticas e sociais que tendiam a mantê-lo dentro da retidão; das quais a religião era a principal. Isso se chamou a Monarquia Cristã: durou dez séculos, fez a Europa; e caiu. O ideal tendia a “uma família”: ideal inexequível em sua totalidade, porque sempre haverá díscolos, a massa sempre será obscura, e o Estado sempre tenderá a usar da força; mas pelo menos havia um conato contínuo para sujeitar a força à razão e a razão ao amor; e para fazer chegar a nação a algo como “uma família”. Por isso justamente há mais sublevações nos países católicos que nos outros, e são mais difíceis de governar; o ideal atávico da “nação como uma família” trabalha terrivelmente nos franceses, nos italianos, nos hispânicos. “Os países protestantes são mais fáceis de conduzir, mas se são conduzidos mal, não têm remédio” – disse o líder irlandês Parnell.
Os homens hoje em dia preferem ter por cima tiranetes irresponsáveis, agitados e passageiros, que os oprimam em nome da “liberdade”. As condições mudaram, os homens já não podem confiar tanto uns nos outros para pôr à cabeça do bem público uma família permanente e inamovível, com poderes absolutos. Portanto ficou mais fácil o advento da “Fera”, que é o outro extremo do eixe político, o polo oposto ao “Pai”. Os grandes impérios pagãos que precederam a Cristo: Assíria, Pérsia, Grécia macedônica e Roma, foram pintados pelo profeta Daniel na figura de quatro feras; e com muita razão.
Na atual economia do mundo, a rejeição a Cristo leva necessariamente ao outro extremo da ordenação política; quer dizer, ao Estado pagão duro e implacável. Da quarta fera, o Império Romano, que Daniel descreve como uma mescla das outras e a mais terrível de todas, profetizou o vidente que surgirá, depois de muitos séculos e diversos avatares, a “Besta do Mar”, ou seja o Anticristo: um poder pequeno que se fará grande, um poder morto que ressuscitará, um poder iníquo que por causa da apostasia do mundo chegará a assenhorear-se de todo o mundo; afortunadamente, por pouco tempo.
Entretanto temos que ir vivendo e tendendo ao governo paternal no político e à obediência nobre e cavalheiresca; embora sejam ideais hoje em dia quase inexequíveis – pelo menos neste país sem esqueleto; quero dizer sem “estruturação política”; sem “instituições”.”
(Pe. Leonardo Castellani, El Evangelio de Jesucristo)