“No post sobre o texto "Me deixem ser pai da minha filha" (http://on.fb.me/1BplI2n), mostrei os problemas diretamente relacionados à ausência paterna na criação de filhos e, das poucas objeções nos comentários, destaco duas: exemplos de mães que criaram bem seus filhos sem pai e a idéia de que os números apresentados são resultado da pobreza e não da ausência paterna. Vamos esclarecer as duas.
Em primeiro lugar, um erro comum nesse tipo de discussão é achar que ciências sociais são exatas. Quando se diz que um fator contribui para um determinado resultado não quer dizer que toda vez acontecerá dessa forma, apenas que há uma tendência e é essa tendência que está sendo medida.
Sempre haverá um "ah, eu conheço o fulano que foi diferente", o que não invalida em nada as conclusões gerais ou os números apresentados. Uma pesquisa que mostre que crianças que usam drogas têm problemas escolares, por exemplo, não é invalidada porque alguém diz "ah, mas eu conheço um menino que cheirou cocaína e passou de ano". O importante em sociologia e nesse tipo de levantamento é entender a tendência geral do comportamento em uma determinada situação e não a busca de regras gerais que sejam aplicáveis a 100% dos casos.
Sobre os números e a pobreza, há uma mistura de ignorância e preconceito em relação aos pobres, como se pobreza e sexo livre fossem sinônimos. No gráfico do post você vai ver que em 1963, um ano antes de Lyndon Johnson lançar seu pacote de medidas assistencialistas batizado de "Great Society", 93% das crianças americanas nasciam em lares de pais casados contra apenas 40% hoje. Houve uma radical mudança cultural no país e não econômica. Repare também que na década de 30, período da Grande Depressão, praticamente não houve alteração do índice.
A queda vertiginosa do número de crianças nascidas em lares de pais casados em 50 anos nos EUA não tem nada a ver com a variação dos níveis de pobreza mas com as idéias disseminadas pela elite cultural ocidental a partir dos anos 60, que foram particularmente impactantes nas faixas de renda mais baixas da população. O aumento do índice de crianças geradas por mães solteiras não foi causado pela pobreza, pelo contrário, foi a pobreza, a falta de informação e uma tendência a mimetizar o comportamento das celebridades e elites que se mostraram um terreno fértil para a assimilação dessas idéias. É como o nome de crianças de celebridades e de pais ricos que, em cinco a dez anos, viram moda para o resto da população, como mostrado por Levitt e Dubner em "Freakonomics".
Existe uma relação entre casamento e padrão de vida, claro, o que já foi medido em diversas pesquisas. Crianças nascidas de mães solteiras nos EUA são pobres em 36,5% dos casos, enquanto apenas 6,4% das crianças criadas por pais casados são pobres, e é por isso que muitos defendem que o casamento é a maior arma contra a pobreza no país.
A educação é outro fator importante nessa tendência. Das mães que não completaram o ensino médio, 67,4% tiveram filhos sem estar casadas, enquanto apenas 8,1% das mães com curso superior completo tiveram o filho solteiras.
Outro dado que deve ser mencionado é que 71,2% das famílias pobres com crianças nos EUA são comandados por solteiros, um número que despenca para 26% entre os lares fora da linha da pobreza.
Quando se juntam os dados de educação e estado civil, os números ficam ainda mais gritantes. Lares com crianças em que o responsável pela casa é casado e tem curso superior estão na pobreza em apenas 1,5% dos casos, ou seja, se você tem curso superior completo e é casado com filhos nos EUA, sua chance de ser pobre é próxima de zero. Já se o responsável pelo lar é solteiro, não completou o ensino médio e tem filhos, sua chance de ser pobre é de 47%.
É claro que números como esses levam a uma leitura apressada de alguns que saem gritando "tá vendo? é a pobreza!" por não se darem ao trabalho de olhar as séries históricas e também checar dados de outros países do mundo não tão influenciados pelas idéias e valores da geração porralouca dos anos 60, que foi a Woodstock fazer filhos se drogando na lama e que hoje está no poder nos EUA.
Há também a questão racial. Enquanto a média nacional de crianças nascidas de pais não casados hoje é de 40% nos EUA, o número de crianças brancas nascidas assim é de 28,6% contra 52,5% dos hispânicos e 72,3% dos negros do país. Mas nem sempre foi assim.
Voltando à época de Lyndon Johnson, em 1964 o número de crianças negras nascidas de pais solteiros era de apenas 24,5%, pulando para 50,3% em 1976, chegando a 70,7% em 1994. Em apenas 30 anos, de 1 em cada 4 crianças negras que nasciam em lares com pais não-casados o número dispara para quase 3 em cada 4. Não há qualquer relação entre esses números e o nível sócio-econômico da população, mas tudo a ver com a mudança cultural do país com reflexos diretos nessa população.
Negros conservadores americanos, como Thomas Sowell, Larry Elder, Jason Riley, entre outros, estão cada vez mais batendo na tecla da cultura pop consumida pelos negros do país que, segundo eles, incentiva e aplaude todo tipo de comportamento socialmente repreensível com consequências sociais desastrosas, como o gangsta rap. Thomas Sowell culpa a “destruição da família negra americana” à criação do que chama de uma “subcultura” com todo tipo de comportamento sexualmente irresponsável sendo glorificado, inclusive pelas elites culturais do país, além da queda do padrão educacional. Veja Sowell comentando esse tema aqui: http://youtu.be/hs5qvovJkwI.
Outro argumento em favor da idéia de que é a cultura que influencia o comportamento sexual e não o nível de renda é olhar estes números em outros países do mundo. No Japão, apenas 2% das crianças que nascem são filhas de mães solteiras. Dados dos anos 90 falam em 3% para Israel e 5% para China. Na América Latina, diretamente influenciada pela cultura americana, os números são ainda maiores do que nos EUA: México 55%, Argentina 58%, Brasil 66%, Paraguai 70% e Colômbia 74%. A média na Europa é de 39%, variando de apenas 7,6% na Grécia, 15,4% na Croácia e 28% na Itália até 47,6% na Grã-Bretanha e Portugal, 54,5% na Suécia, 57,1% na França e 66% na Islândia.
A grande variedade desses números mostra que é a cultura específica de cada país que mais influencia o índice de crianças nascidas e criadas em lares de pais solteiros e não a pobreza como alguns ainda acham. Se a pobreza levasse a mais nascimentos de crianças sem pais casados, por que a Grécia (renda per capita de US$ 21 mil) tem menos de 8% da crianças nessa situação enquanto a Islândia (US$ 45 mil de renda per capita) tem 66%? Por que a Croácia (US$ 13,5 mil de renda per capita) tem 15,4% de crianças nascidas de mães solteiras contra os 57,1% da França (US$ 46 mil de renda per capita)? O Japão tem a terceira maior economia do mundo e quase todas as crianças nascem em lares de pais casados. O Brasil tem a sétima economia do planeta e 2 em cada 3 crianças nascem de mães solteiras.
O assunto é explosivo, politicamente incorreto e envolto em muito preconceito. Mesmo que muita gente não goste, é perfeitamente possível mostrar que o estado civil dos pais e a presença do pai na educação dos filhos tem uma influência no futuro da criança tão ou mais importante do que apenas seu nível de renda.”
(Alexandre Borges, em postagem no Facebook de 25.01.2015)